terça-feira, 21 de abril de 2009

ARBITRAGEM DE FUTEBOL: ESTRESS E CONTROLO COERCITIVO (III)

Nesta terceira e última parte os títulos são: RELAÇÃO ENTRE ESTRESSE E DESEMPENHO, CONCLUSÃO E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

Uma vez mais quero agradecer a Norma Pereira, Renata Santos e Eduardo Cillo não só pelo excelente trabalho de pesquisa que concretizaram, como me terem proporcionado o privilégio da sua divulgação em Portugal. Bem-hajam!

RELAÇÃO ENTRE ESTRESSE E DESEMPENHO

Para Rech, Daronco e Paim (2002), existe uma forte relação entre as capacidades psicológicas dos árbitros e o desempenho dos mesmos, deste modo o sucesso do árbitro depende de suas capacidades mentais, confiança, concentração e controle emocional. Os árbitros falam com freqüência da importância da capacidade mental, na realização de tarefas difíceis, tomar uma decisão polêmica, não perder controle em jogo, permanecer calmo e não se deixar se incomodar.

Segundo Reis (2002), vice-presidente da APAF (Associação Portuguesa de árbitros deFutebol), ao analisar as razões dos erros de árbitros, a partir da observação baseada na análise de jogos, é que eles erram, porque tentam demais não errar. Ficam tão pressionados, tão tensos, ansiosos que acabam ficando nervosos e erram mesmo nas coisas mais simples. Deste modo podemos compreender que há uma alteração no foco de concentração, o qual deveria estar voltado para as situações presentes no momento do jogo, e que acaba sendo desviada para situações encobertas (ou mentais) prendendo sua atenção e utilizando sua energia de forma indevida às exigências do ambiente à sua volta.

Segundo Martin (2001), a ansiedade ou o nervosismo são causados pela apresentação de estímulos aversivos. Comentários negativos podem interferir diretamente no desempenho destes árbitros, desde que os mesmos não saibam ou não consigam manter o foco da atenção. O nervosismo interfere no desempenho, primeiro porque, a atenção fica tão concentrada, em um atleta nervoso, que ele tem menor probabilidade de perceber deixas externas importantes. O excesso de nervosismo pode consumir muita energia e diminuir a resistência. Um terceiro fator do nervosismo é que este aumenta a adrenalina, fazendo com que possam haver precipitações, durante uma rotina que domina bem e por último que o excesso de nervosismo, acrescenta estímulos adicionais ao ambiente competitivo, que interfere com a generalização de estímulos de uma habilidade. Para compreender a relação entre aspectos psicológicos e o desempenho na arbitragem basta traduzir o que foi descrito acima para um atleta.

Erbolato (apud Borelli & Neto, 2004), afirma que um grande problema existente na arbitragem é a questão da profissionalização; a maioria dos árbitros possui outros tipos de atividades profissionais. Daí decorre uma série de problemas que afetam diretamente o desenvolvimento das habilidades, psicológicas ou não, necessárias ao exercício da arbitragem. Quando um árbitro passa a atuar em muitos jogos, quase não sobra tempo para dedicação familiar. Também não sobra tempo para que os árbitros se preparem convenientemente em termos físicos, aspectos teórico-práticos e treino mental. Por causa do excesso de atividades, fica pendente também, o descanso físico e mental.

O autor reflete, também sobre possíveis melhorias na arbitragem. Claro que se os árbitros se tornarem profissionais, não vão se tornar imunes aos erros, mas poderão aumentar a qualidade do exercício de suas funções em um futuro próximo. Se os árbitros desempenharem a função o tempo todo, estarão mais bem preparados para lidar como os erros e com as pressões.

Em termos sociológicos, a própria história doFutebol contribuiu para pressões sobre os árbitros. OFutebol aceita violência demais, muitas polêmicas, discussões, conflitos, grandes interesses financeiros; aumentando-se assim as situações de risco para decisão dos árbitros. Nesta situação se faz necessário segundo a APAF, com urgência, que seja efetuado um estudo sobre os árbitros para se apurar com rigor científico o comportamento de cada um.

Outro fator complicador é a falta de coesão em grupos de arbitragem, que também contribui, e muito para aumentar a probabilidade de erros, em muitas equipes de árbitros não há espírito de grupo o que dificulta muito a comunicação e um desempenho satisfatório.

Dentro deste contexto se faz necessário um apoio psicológico aos árbitros, mas segundo APAF (2002), faltam ainda estruturas de apoio efetivo aos árbitros, a existência de profissionais como: psicólogos, médicos, massagistas, fisioterapeutas, nutricionistas, que poderiam ajudá-los nestas questões.

Segundo Silva (2002), oFutebol se tornou uma atividade complexa que envolve grandes investimentos financeiros, planejamento, atualização de conhecimentos da medicina e psicologia, processo contínuo de aprimoramento. Neste ambiente que se forma, fica evidente a importância dos aspectos emocionais, por isso hoje se faz necessário a presença de psicólogos no meio esportivo. Um passo importante, e inicial, seria identificar as possíveis fontes de pressão e estresse, neste contexto.

Anshel e Weinberg (1995), analisaram 15 possíveis fontes de estresse em árbitros de basquetebol, nos Estados Unidos e na Austrália. Apontam com principais estressores: erro em apitar uma falta; ser insultado ou acusado por um treinador; sentir-se ameaçado fisicamente; estar mal posicionado ao apitar uma falta; sofrer uma lesão. Estes resultados coincidem parcialmente como os de outro estudo de Goldsmith e Williams (1992), com árbitros deFutebol americano e voleibol. Como estes resultados coincidem de forma apenas parcial, é necessária a continuidade de investigação.

Segundo Cruz (1997), as fontes de estresse dos árbitros variam de acordo com o esporte, e nível de competição, às vezes até variam de acordo com a localidade. Estudos de Anshel e Weinberg (1995), Goldsmith e Williams (1992), Rayney (1995) e Taylor, Daniel, Leith & Burke (1990), podem ser assinaladas como principais investigações sobre fontes de estresse, das quais puderam ser obtidos os seguintes dados: medo de errar; conflitos interpessoais com técnicos e jogadores; medo de agressão física; medo de insulto verbal.

Zoller (1985), apresenta uma série de estudos que levam a pensar que a profissão de arbitragem é estressante. As características que corroboram com esta informação são: os árbitros trabalham com outras profissões, muitas vezes em horário integral. O árbitro tem que apitar várias partidas em uma semana, nas quais acabam se submetendo ao público, aos treinadores, além do desgaste das viagens.

Outro estudo realizado por Samulski, Noce e Costa (1998), aponta os seguintes fatores como principais fontes de estresse para árbitros deFutebol: "Preparação física inadequada"; "Estar cansado fisicamente/psicologicamente"; "Cometer erros consecutivos"; "Errar em jogadas decisivas"; "Dormir mal na noite anterior a partida"; "Chegar atrasado".

Dentre os estudos citados percebe-se que há certa diversidade na identificação das possíveis fontes de estresse. Resumidamente os estudos apontam para fatores relacionados a conflitos interpessoais com possibilidade de agressão (Anshel, 1989; Goldsmith & Williams, 1992; Rayney, 1995; Taylor, 1990); erros de desempenho (Anshel & Weinberg, 1995; Goldsmith & Williams, 1992; Rayney, 1995; Taylor, 1990; Samulski, Noce, Costa, 1998); dificuldades relacionadas ao preparo físico (Anshel & Weinberg, 1995; Samulski, Noce, Costa, 1998). Um fato que chama atenção, e que dá convergência aos dados encontrados pelos autores refere-se ao fato de que em todos os estudos há evidências ou indícios de fatores considerados psicológicos interferindo no desempenho.

CONCLUSÃO

Assim sendo, os dados apontam para o fato de que há uma diversidade de fatores estressantes incidindo sobre a arbitragem. Em uma análise geral dos estudos é possível identificar muitos dos problemas de desempenho e/ ou psicológicos como fruto da relação constante com as fortes pressões, intra e extra-campo, a que estão submetidos. Neste sentido vale o entendimento das "pressões" a partir do conceito de coerção de Sidman (1995). Seria o estresse, então, um dos subprodutos do controle coercitivo. Desse modo as variáveis (pressões) que cercam os árbitros seriam parte importante do processo de formação do estresse. Estes fatos por si só, com destaque para a multiplicidade de fatores estressores, já justificam a necessidade de um estudo mais aprofundado acerca destas variáveis e dos seus efeitos sobre a saúde e o desempenho dos árbitros. Uma rigorosa definição acerca das variáveis mais relevantes neste processo seria um passo importante no planejamento e execução de programas de preparo psicológico para o enfrentamento de situações tão exigentes. De um modo complementar, e contraditório, vale ressaltar que a falta de estudos nesta área demonstra a pouca atenção que ainda é dada à preparação psicológica, tanto por parte dos próprios árbitros quanto dos dirigentes e profissionais do esporte.

Frente a tudo que foi apresentado na revisão de literatura parece válido e promissor produzir conhecimentos para fundamentar intervenções que levem a: reduzir comportamentos inadequados e substituí-los por outros mais adequados, promover a aquisição por parte dos árbitros de autocontrole e outras habilidades e desenvolver estabilidade emocional nos árbitros, durante as partidas deFutebol e perante as críticas da imprensa.

Um objetivo adicional futuro é o da divulgação das possibilidades de investigação e fundamentação teórica relacionadas à psicologia do esporte, potencializando, assim, o envolvimento dos árbitros com este segmento da preparação esportiva, afim de melhorar o desempenho e a qualidade de vida dos mesmos.

Referências Bibliográficas

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Anshel, M. H. (1995) Development of a rating scale for determining competence in basketball referees: implications for sport psychology. The Sport Psychologist, 9, 4-28.
Anshel, M. H.; Weinberg, R. S. (1995) Sources of acute stress in American and Australian basketball referees. Journal of Applied Sport Psychology, 7, 11-22.
Associação Portuguesa de Árbitros deFutebol. (2004) Por que os árbitros erram tanto? Mas será os árbitros que erram?Disponível em: http://www.apaf.pt/caracter.htm. Acesso em 04 de abril 2004.
Borelli, V.; NETO, A. F . Jornalismo esportivo como construção.Disponível em: http://www.ufsm.br/cadernos de comunicacao/ Acesso em: 07 abril 2004.
Cruz, J. (1997) Psicología del arbitraje y el juicio deportivo. Madrid: Editorial Sintesis.
Goldsmith, P. A.; Williams, J. M. (1992) Perceived stressors for football and volleyball officials from three ratings levels. Journal of Sport Behavior. 15, 106-118.
Lipp, M. N.; Novaes, L. E. (1998) O Stress. São Paulo: Contexto, São Paulo.
Martin, G. L. (2001) Consultoria em psicologia do esporte: emoções e desempenho esportivo. Campinas: Instituto de Análise do Comportamento.
Nitsch, J. R. (1981) Stress: Theorien, Untersuchungen und Massnahemen. Bern/Stuttgart/Wien: Verlag Hans Huber.
Rayney, D. W. (1995) Sources of stress among baseball and softball umpires. Journal of Applied Sport Psychology, 7, 1-10.
Rech, C. R.; Daronco, A; Paim, M. C. C. (2002) Tipo de temperamento do árbitros. Revista Digital. 48, ano 8.
Reis, V. (2004) Por que os árbitros erram tanto? Mas será os árbitros que erram?Disponível em: http://www.apaf.pt/caracter.htm. Acesso em 04 de abril 2004.
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Samulski, D. (2000) Treinamento psicológico de atletas de alto nível. In.: K. Rubio (org.) Encontros e desencontros: descobrindo a psicologia do esporte. São Paulo: Casa do Psicólogo.
Samulski, D.; Chagas, M.; Nitsch, J. (1996) Stress: teorias básicas. Belo Horizonte: Editora Gráfica Costa & Cupertino.
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SILVA, T. P. (2002) Psicologia Esportiva.Disponível em: http://www.ceppe.com.br/cronicas/psiesp.htm. Acesso em: 19 out.2002.
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Zoller, S. (1985) Learning how to live with stress. Referee Magazine. 10 (5), 48-51.

Endereço para correspondência
Eduardo Cillo, Rua Turfa, 1411, ap. 303 - Barroca
30430-380 Belo Horizonte - MG
E mail: edcillo@yahoo.com

3 comentários:

Anónimo disse...

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Anónimo disse...

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Anónimo disse...

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